A pobreza pode ser definida como a situação em que as pessoas não têm rendimentos suficientes, no âmbito familiar, para sua subsistência.1 O Banco Mundial desenvolveu uma metodologia para sua mensuração que é amplamente utilizada em nível internacional, inclusive no monitoramento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em que a erradicação da pobreza extrema é o primeiro dos objetivos firmados em acordo entre os 193 países que integram a Organização das Nações Unidas (ONU).
A metodologia, divulgada em 1985 e revisada periodicamente, estabeleceu a paridade do poder de compra (PPC) como medida para a linha de extrema pobreza. Com a aplicação dessa metodologia, definiu-se na extrema pobreza, as pessoas que dispunham de menos de US$ 1,00 por dia em 1990 (PPC de 1985). Em 2022, esse valor foi atualizado para US$ 2,15 (PPC de 2017) e, na pobreza, para US$ 6,85. Esses valores, em reais mensais, corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA de 2023, ficaram em R$ 209/mês e R$ 665/mês, respectivamente.2
A Fundação Seade apresenta análise com informações para o Estado de São Paulo, considerando-se o rendimento domiciliar per capita da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) e os valores da linha de pobreza e de extrema pobreza do Banco Mundial, referentes a 2023 e sua evolução a partir de 2012, além de indicadores complementares ao tema, como o Índice de Gini e o rendimento domiciliar per capita segundo percentis de renda.
Extrema pobreza no Estado diminui de 2,9% para 2,2% da população
Em 2023, dos 47,3 milhões de pessoas no Estado de São Paulo, 1,0 milhão viviam abaixo da linha da extrema pobreza, 298 mil pessoas a menos do que em 2022. Em termos percentuais, a população em extrema pobreza passou de 2,9% para 2,2%, entre 2022 e 2023, menor do que no Brasil (4,4%), proporção que encobre valores extremamente altos, como o do Acre (13,2%) e outros mais baixos, como os do Rio Grande do Sul e Goiás (1,3%).
Quanto à pobreza, havia, no Estado, 7,8 milhões de pessoas nessa situação, em 2023, 1,4 milhão a menos que no ano anterior, diminuindo de 19,6% para 16,5% do total da população. Esse percentual é o quarto menor entre os registrados no Brasil, cuja média era de 27,4%. Também no Acre apresentou-se a maior proporção (51,5%), enquanto a menor foi a de Santa Catarina (11,5%).
Gráfico 1 – População classificada em situação de extrema pobreza e de pobreza
Brasil e unidades da federação, 2022-2023, em %
Menor nível de pobreza é registrado em 2014 e 2023
Em uma linha do tempo iniciada em 2012, a população do Estado de São Paulo em situação de extrema pobreza alcançou, em 2023, proporção igual à de 2012 (2,2%), sendo que a menor foi registrada em 2014 (1,9%) e, a maior, em 2021 (4,4%) – período da pandemia de Covid-19 –, quando 2,1 milhões de pessoas estavam abaixo da linha da extrema pobreza.
Em 2023, a proporção de pessoas vivendo na pobreza era 16,5%, percentual idêntico ao de 2014, o menor da série histórica. Mais uma vez, foi no ano de 2021 que se registrou a maior parcela da população abaixo da linha de pobreza (23,7%), para o período analisado.
Gráfico 2 – População classificada em situação de extrema pobreza e de pobreza
Estado de São Paulo, 2012-2023, em %
Como mais de três quartos do rendimento médio domiciliar das famílias do Estado de São Paulo é formado pelos rendimentos do trabalho, pode-se afirmar que os fatores mais importantes para a redução da pobreza são o crescimento da atividade econômica, a geração de postos de trabalho e o aumento do rendimento dos ocupados na base da pirâmide salarial, além do papel complementar desempenhado pelos programas de transferência de renda e previdência social para a parcela da população excluída ou à margem do mercado de trabalho.
A associação entre a retração da pobreza e da extrema pobreza e o aumento do nível ocupacional e/ou redução da desocupação, pode ser verificada comparando-se o comportamento da proporção de pessoas nessas situações e o das taxas de desocupação e subutilização da força de trabalho,3 em que coincidem os menores valores nos anos iniciais da série, com destaque para 2014 e, os maiores, em 2021.
Em 2023, a taxa de desocupação (7,5%) e a taxa composta de subutilização da força de trabalho (14,7%) estavam entre as menores da série, comparáveis às de 2012, 2013 e 2014. As menores taxas foram registradas em 2012, para a taxa de desocupação (7,2%) e, em 2014, para a taxa composta de subutilização da força de trabalho (12,8%). O nível de ocupação, por sua vez, atingiu seu maior patamar em 2023 (62,3%).
Gráfico 3 – Taxa de desocupação e taxa composta de subutilização da força de trabalho
Estado de São Paulo, 2012-2023, em %
Pobreza diminui, mas aumenta a concentração de renda
Apesar da redução da pobreza e da extrema pobreza, não houve melhora do nível de concentração de renda entre 2022 e 2023. Utilizando-se o Índice de Gini,4 como medida de desigualdade no Brasil e nas unidades da federação, o Estado de São Paulo passou da 12a posição em 2022 (0,500), para a 17a posição em 2023 (0,504). Ainda assim, com resultado melhor do que o registrado para o Brasil (0,518).
Ao se observar a evolução do indicador no Estado, apesar do aumento da desigualdade entre 2022 e 2023, esse resultado é melhor do que os apresentados de 2012 a 2021, destacando-se os de 2018 (0,538) e 2021 (0,533) como os piores.
Ajuda a explicar o aumento da concentração de renda no último ano, o crescimento maior dos rendimentos dos mais ricos no Estado de São Paulo. O rendimento médio domiciliar per capita dos 10% da população com rendimentos mais altos (R$ 9.822) aumentou 14,3%, em 2023. Aumento mais intenso, de 17,3%, ocorreu para a parcela de 1% mais ricos, para os quais o valor médio recebido passou a ser de R$ 25.470. Para os 20% mais pobres, esse rendimento cresceu 11,3% e passou a valer R$ 488, tornando a diferença entre esses rendimentos ainda maior.
Gráfico 4 – Índice de Gini da distribuição do rendimento domiciliar per capita
Brasil e unidades da federação, 2022-2023
Gráfico 5 – Índice de Gini da distribuição do rendimento domiciliar per capita
Estado de São Paulo, 2012-2023
Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua; Fundação Seade.
Notas: Acumulado de primeiras visitas para as informações referentes ao período de 2012 a 2019 e o ano de 2023; acumulado de quintas visitas para o período de 2020 a 2022. Rendimentos deflacionados para reais médios do próprio ano. Exclusive residentes dos domicílios classificados como pensionistas, empregados domésticos e parentes de empregados domésticos. Taxa da conversão de paridade de poder de comprar para consumo privado R$ 2,3273771 para U$ 1,00 PPC 2017, valores diários tornados mensais e inflacionados pelo IPCA para anos recentes.
Notas
1. Além do critério monetário, existem outros indicadores, como o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM/PNUD), que consideram, por exemplo, o acesso a serviços básicos – saúde e educação – e moradia.
2. Pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA em São Paulo, o valor mensal da linha de extrema pobreza correspondia a R$ 212 e, o da pobreza, a R$ 675, em 2023.
3. São consideradas desocupadas as pessoas com 14 anos e mais que não estavam trabalhando na semana de referência, mas procuraram trabalho e estavam disponíveis para trabalhar. Na taxa composta de subutilização da força de trabalho consideram-se, além dos desocupados, os subocupados por insuficiência de horas trabalhadas e as pessoas que, mesmo não estando ocupadas ou desocupadas, procuraram trabalho, mas não estavam disponíveis para trabalhar e aquelas que não procuraram, mas gostariam de trabalhar e estavam disponíveis para isso.
4. O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, é um indicador que mede a desigualdade na distribuição de renda, apresentando valores de zero a um – em que zero representa uma situação de igualdade, ou seja, todos têm a mesma renda e um é a situação de maior desigualdade.